27 outubro 2007

Memórias dos dias

Ás vezes

Ás quatro e um quarto saio, vou buscar a mais pequena.

Ela vem com um sorriso em passo de corrida, assalta-me com um abraço e sorrio.

Porque será que esta alegria se repete todos os dias?

Saímos, ela nunca tem pressa. Sentamo-nos no banco ao lado da porta, depois descemos as escadas (a sua mão pendurada com o seu peso na minha mão) e paramos intermináveis vezes enquanto tenta apanhar todos os minusculos qualquercoisa que os seus olhos mais rasteiros detectam no chão.

Vamos buscar os manos?

Nãããããão

Não? E sabes dizer sim? Sim?

CHim. Pois, sim é mais difícil do que não.

Entramos no carro, cadeirinha, cinto. Abro janelas que está calor ainda.

No caminho a cabeça dispara em pensamentos, nem me lembro de a ouvir lá atrás. Jantar?, nem sempre relembro o que está decidido, alguma coisa para comprar obrigatória? Hoje não há actividades extra.

Na outra escola vou primeiro ao do meio, sai ás quatro e meia. Miúda pequena no carrinho que tiro da mala (ela assim não foge para todo o lado, nem tenho que a carregar ao colo).

Ele lá vem, feliz e brincalhão. Fala do carrinho que lá ficou, dos amigos que reencontrou, está orgulhoso de ter crescido. A mesma alegria contagia-me o sorriso

Vamos então ter com a mais velha, entrada de cima na mesma escola.

Espero que saia enquanto os mais novos se abraçam reencontrados.

Ela chega, alta, sorriso ternurento, e começa a falar.

Estamos todos, seguimos o nosso ritual de entrada no carro, acomodamo-nos e partimos.

Hoje não pararemos para comprar nada, vamos directos a casa.

A mais velha fala e fala, conta coisas e histórias e novidades e sensações, os outros também querem falar. Ela pára e ouvimos também o miúdo, o que fez, o que brincou, quem encontrou, a mais nova também tem coisas a dizer embora nem sempre a tradução seja muito fiável.

A cacofonia é inevitável e sorrio, apetece abraçar com o sorriso. Conduzo nas curvas da estrada sem pressa.

Chegamos, as portas abrem-se e todos saem (a mais pequena fica, quer ficar a conduzir)

Levo tralhas e volto, a buscá-la.

Depois, as mil e uma coisas do regresso a casa.

Ás vezes todos estes passos não correm leves,

talvez me irrite ou perca a paciência no limite do tempo e do cansaço,

ou porque há problemas a que não vejo o fim.

Ás vezes um deus estranho sorri e lembra-se de me trazer respostas

Coisas que parecem pequenas aos outros,

Mas que nos aliviam todos os sentidos.

Gracias á la vida, manita

21 outubro 2007

A Herança do Vazio

De Kiran Desai

O Livro foi vencedor do Man Booker Prize 2006, e digo isso porque foi esse o motivo que me levou a lê-lo.

A autora é Indiana, e, tal como em O Deus das Pequenas Coisas, um livro sobre a Índia que curiosamente foi também vencedor de um booker prize em 1997, a sua leitura foi-me difícil.

Em ambos os tempos narrativos são intercalados entre passados e presente, e em ambos também me fica uma sensação de lenta agonia misturada com tristeza. Encontro-lhes passagens poéticas, de poesia sobre o feio ou horrível, se é que isso existe, e isso confunde-me. Encontro-lhes também uma certa inevitabilidade no ser, o que me irrita profundamente.

E se no segundo, que li já há algum tempo, tenho a vaga recordação de uma das personagens principais como alguém com interesse em si, já naquele de Kiran Desai apenas encontro uma personagem com piada, verdadeiro optimista e lutador, num “mundo imundo” (como diz a canção de Alcione): um negro clandestino, cheio de manha e alegria de viver, a que me colei com alguma esperança de que conseguisse tornar menos penosa a leitura.

Li-os ambos até ao fim, são poucos os livros que deixei por ler daqueles que começo, mas como dizia M, em Campanhã, depois de feitas as contas às horas de leitura que me restam, parece-me que perdi o meu tempo.

Alguém com diferente opinião me gostaria de “rentabilizar” a leitura? Há tantas coisas que não lemos nos livros quando entramos pelo seu lado errado.

13 outubro 2007

Sábado à tarde

Regresso, a pausa que tardava chega agora.

Entre silêncios fiquei

Entre palavras me reencontro.

Afinal como sabeis

Aqui é

O lugar da janela

E as janelas são o quadradinho de luz

Que se reflecte no lado de lá da parede.

Chego ao amanhecer,

Os tons ainda são alaranjados e estendem sombras pelos jardins,

Tudo está ainda sossegado,

Amanhece devagar este acordar

E os olhos ainda preguiçosos

Vão – se enchendo de luz.

Passeio devagar por aqui,

É bom regressar.